segunda-feira, novembro 20, 2006

Não Cantes


Olha em redor dos bosques as veredas destruídas
pela explosão devastadora das minas e ouve
as vozes límpidas morrerem no poema

Antes e depois da alegria
antes e depois do pânico

Grava na parede esboroada do ar
O sulco ténue da infância – e fala-me dela
Aproxima-te
para veres o horror tranquilo das imagens
no fundo dos meus olhos

Antes e depois da alegria
antes e depois do pânico

Debruça-te naquele terraço virado ao inimigo
onde um rosto de estuque arde e
um ferro reduziu a memória a nada

Antes e depois da alegria
antes e depois do pânico

Em volta das casas demolidas o anoitecer
O lume incontrolável – e alguém
atravessa o deserto
com uma criança de jade nos braços

Antes e depois da alegria
antes e depois do pânico
mas
sempre durante o sofrimento

Não cantes


Al Berto, “Horto de Incêndio”

* Foto de Charles Diesel