segunda-feira, novembro 11, 2019

Coragem


É nas pequenas coisas que a vemos.
O primeiro passo da criança,
tão incrível como um terramoto.
A primeira vez que andaste de bicicleta,
desequilibrando-te pela calçada.
A primeira estalada, quando o teu coração
saiu sozinho em viagem.
Quando te chamaram de bebé chorão
ou pobre ou gordo ou maluco,
e te tornaram um completo estranho,
Tu bebeste esse ácido
e escondeste-o.

Mais tarde,
se enfrentaste a morte das balas e das bombas,
não o fizeste com um estandarte,
mas apenas com um chapéu para
cobrir o teu coração.
Não afagaste a tua fraqueza
embora ela estivesse ali.
A tua coragem era um carvão
que continuaste a engolir.
Se o teu amigo te salvou e morreu ao fazê lo
Então a sua coragem não foi coragem
Foi amor; amor tão simples como espuma de barbear.

Mais tarde
Se viveste em grande desespero
Fizeste-o sozinho
Recebendo uma transfusão do fogo,
Recolhendo as crostas do teu coração,
E depois torcendo-o como uma meia.
De seguida pulverizaste a tua tristeza
Esfregaste-lhe as costas
E cobriste-a com uma manta.
E depois de dormir um pouco
Ela acordou com as asas das rosas
E foi transformada.

Mais tarde
Quando enfrentares a velhice e a sua conclusão natural
A tua coragem ainda será mostrada nos pequenos caminhos.
Cada primavera será uma espada que afiarás,
Aqueles que amas viverão numa febre de amor.
E vais negociar com o calendário.
E no último momento
Quando a morte abrir a porta das traseiras
Vais calçar os chinelos de quarto
E sair.


Anne Sexton



    * Foto retirada da Internet