sexta-feira, novembro 15, 2019

A certeza dos dias que morrem


Encontrámo-nos nessa tarde sombria
E o teu sorriso pleno foi todo o sol que eu precisava,
Como o calor que nos preenche quando é verão
E estamos na praia ao fim da tarde.
Estávamos no começo do mundo, no início do nosso tempo juntos.
E todos os caminhos me parecerem floridos
todos os sítios eram novos e inquietantes,
Enquanto falávamos do frio que fazia e de como o inverno tinha chegado tão cedo.
Fui tua nesse primeiro instante. Sei-o hoje com a certeza dos dias que morrem.
As tuas mãos foram a minha cama e a tua boca o único sitio onde queria ficar.

Estava feliz como fui poucas vezes depois disso.
Amei-te no escuro.
Recordo muitas vezes esse dia com júbilo.
E antes das lágrimas chegarem


Sorrio sempre. 




     *Foto retirada da Internet

segunda-feira, novembro 11, 2019

Coragem


É nas pequenas coisas que a vemos.
O primeiro passo da criança,
tão incrível como um terramoto.
A primeira vez que andaste de bicicleta,
desequilibrando-te pela calçada.
A primeira estalada, quando o teu coração
saiu sozinho em viagem.
Quando te chamaram de bebé chorão
ou pobre ou gordo ou maluco,
e te tornaram um completo estranho,
Tu bebeste esse ácido
e escondeste-o.

Mais tarde,
se enfrentaste a morte das balas e das bombas,
não o fizeste com um estandarte,
mas apenas com um chapéu para
cobrir o teu coração.
Não afagaste a tua fraqueza
embora ela estivesse ali.
A tua coragem era um carvão
que continuaste a engolir.
Se o teu amigo te salvou e morreu ao fazê lo
Então a sua coragem não foi coragem
Foi amor; amor tão simples como espuma de barbear.

Mais tarde
Se viveste em grande desespero
Fizeste-o sozinho
Recebendo uma transfusão do fogo,
Recolhendo as crostas do teu coração,
E depois torcendo-o como uma meia.
De seguida pulverizaste a tua tristeza
Esfregaste-lhe as costas
E cobriste-a com uma manta.
E depois de dormir um pouco
Ela acordou com as asas das rosas
E foi transformada.

Mais tarde
Quando enfrentares a velhice e a sua conclusão natural
A tua coragem ainda será mostrada nos pequenos caminhos.
Cada primavera será uma espada que afiarás,
Aqueles que amas viverão numa febre de amor.
E vais negociar com o calendário.
E no último momento
Quando a morte abrir a porta das traseiras
Vais calçar os chinelos de quarto
E sair.


Anne Sexton



    * Foto retirada da Internet

segunda-feira, novembro 04, 2019

Plágio


O nosso Amor é como um plágio:

O que eu sinto és tu que dizes,

O que eu digo és tu que constróis.

E nunca tem fim esta imitação: há sempre um caminho que nos encontra antes de nos perdermos na noite.

O nosso tempo é como um espelho:

O teu reflexo imitando a vida

E as minhas mãos sempre frias, cortadas pelo vidro.

É certo que no fim deste dia de Outubro

Não sei quem plagia quem: se eu a ti, se tu a mim

Ou se o Amor a nós os dois.