Lost Weekend

Um dia é maior do que a soma
das suas horas, às vezes comporta
todos os invernos e as estações
assombradas
pelos prejuízos do prazer.

Eu e tu, que desculpa ainda nos justifica?
A cidade não foi feita para as nossas
pretensões,
está apenas alastrada por dentro de nós,
crispação
de pedras e espinhos no laço desfeito
entre as veias.

Adiantamos o corpo aos rolamentos da
noite,
é a própria razão que nos ilumina os
atalhos
para o esquecimento. Um ano inteiro não
será suficiente
para tudo o que não nos acontece.

Rui Pires Cabral

Útero

No momento sublime da minha raiva
Falo-te com a boca amarga e as mãos desfeitas,
Sufocada pelo tempo perdido.
Tu és como um nado-morto, um filho carregado num ventre amoroso, Expelido com sofrimento e sangue,
Nascido sem alma nem respiração.
Um ser de olhos vítreos e de cor indefinida, sem luz e sem pulso, uma estátua inerte manchada com o odor das minhas entranhas.
Tu e eu nas trevas, dois seres mortos á beira da vida.
Duas crias nascidas de uma mulher de seios efémeros e de coração estéril, mastigando o nome de um útero inútil.